No outro lado do mundo, 54% dos venezuelanos disseram a Hugo Chaves que pode perpetuar os seus governos. Um processo eleitoral sobre o qual os observadores europeus convidados não detectaram erros razoáveis para classificá-lo de ilegal ou de fraudulento.
Os que pugnam pela saída de cena de Chaves cometem, inadvertidamente diria, uma enorme atrocidade ao menosprezar o voto popular, atribuindo as mais variadas razões policiais e sociais para o apoio ao Presidente Venezuelano, esquecendo de fazer contas. A oposição consegui 46% dos votos e a abstenção rondou os 30%. Mesmo uma leitura superficial a estes dados permite perceber que o futuro político de Chaves não é assim tão certo e que a pressão que exerce sobre a sociedade tem efeitos duvidosos. Aos conspirativos resta a hipótese dos resultados terem sido engendrados para fabricar uma falsa ideia de equilíbrio democrático…
Mesmo reconhecendo as atrocidades que são cometidas por Chaves, como os ataques à liberdade e imprensa, à propriedade privada e ao natural funcionamento da economia, a verdade é que perante os resultados do referendo dificilmente se pode dizer que a democracia não cumpriu os seus objectivos na Venezuela.
Serve esta referência às marés políticas do outro lado do Atlântico, com quem Portugal mantém afinidades para além das que advêm da presença de emigrantes no país, para reflectir sobre uma das mais “kitsch” novelas políticas do nosso Portugal: a da limitação dos mandatos políticos.
É sabido que a perpetuação nos lugares de poder, na autarquias e noutras instâncias governativas, tem favorecido os menos escrupulosos na gestão da res publica. O abuso de poder e a fraude têm sido sobejamente noticiadas Portugal fora. Mas a questão é esta: a limitação de mandatos é o instrumento certo e eficaz para a transparência e o rigor no poder? NÃO. Na minha visão é anti-democrático que um grupo de iluminados, que à pala de uma ideia de representatividade, se ache na razão de controlar a vontade do povo… Não será por limitar os mandatos que as falcatruas vão desaparecer ou que a classe política vai sair do último lugar do ranking da credibilidade.
O sistema não é perfeito, precisa de mais fiscalização, de regras anti-abuso e de boa governação. E, por isso, é utópico considerar que a limitação de mandatos elimina a corrupção nos corredores do poder.
Em suma, tenho dificuldade em dizer que a democracia está a cumprir os seus objectivos quando se condiciona um qualquer cidadão de continuar um bom trabalho de governação e, consecutivamente, ao determinar as escolhas dos eleitores e a hipótese de aceitação ou negação das políticas desenvolvidas.
Marco Paulo Freitas
PS.: comentários no mesmo sentido foram feitos em directo na RTP-Madeira.